06 dezembro 2005

O modelo - parte 9

 
"...assim como nós também temos perdoado aos nossos devedores."
(Mateus 6:12)

Finalmente chegamos ao ponto da oração modelo em que aparentemente Jesus nos incentiva a continuarmos fazendo o que mais gostamos de fazer quando oramos: barganhar. "Veja, Senhor, já que eu tenho perdoado aos outros, mereço o Teu perdão também". Somos exímios em mostrar a Deus a conveniência de atender os nossos pedidos. Ainda que eventualmente não tenhamos a cara de pau de listar nossos bons atos como que nos recomendando a Deus, somos hábeis em tentar dar a entender que pode ser bom para Ele fazer o que pedimos. Por absurda que seja essa idéia.

Ocorre que essa hipótese não faz o menor sentido na moldura da relação pai-filho, especialmente quando o que está em jogo é perdão. Como tentei defender na última semana, o perdão do pai que ama seu filho já está dado antes que ele o peça. É incondicional, independe de qualquer ato anterior dele.

Paulo parece concordar comigo. Em dois momentos (Efésios 4:32 e Colossences 3:13) ele insta com os cristãos para que pratiquem o perdão porque já foram perdoados eles também. Ou seja, o perdão divino, para Paulo, é anterior ao perdão entre homens. Não apenas isso, mas o perdão divino é o verdadeiro impulsionador, é o princípio, é o que torna possível o perdão entre homens.

Vejo na preocupação de Jesus em colocar a questão do perdão no nível "horizontal" dentro da Sua oração modelo uma derramada súplica para que Sua igreja fizesse justamente o que não está mostrando ser capaz de fazer hoje: multiplicar o perdão que recebeu. Essa mesma preocupação Ele transformou em parábola quando contou do grande devedor perdoado que não conseguia ele próprio perdoar a dívida muito menor do outro. Se a igreja fosse capaz de perdoar aos seus "devedores", estaria de braços e sorrisos abertos a pessoas diferentes do padrão (moral, racial ou simplesmente estético) que ela prega, sem falar na nova dimensão que o relacionamento entre os próprios membros da igreja teria.

Penso que é justamente porque os cristãos não se sentiram verdadeiramente perdoados, ou não perceberam a imensidão da amplitude desse amor, que não sabem ser multiplicadores da graça. "O amor de Cristo nos constrange", disse o mesmo Paulo (II Coríntios 5:14). Se você e eu não nos sentimos constrangidos a enxergar o outro de forma diferente - de forma inclusiva, perdoadora, tolerante e com amor - é porque não conhecemos o amor de Cristo.

Pois bem, a oração não é uma barganha. É uma conversa franca, aberta, entre pessoas que se amam, sendo que uma delas deveria sentir nessa aproximação uma inesgotável gratidão em resposta a um inesgotado amor. Apenas pressentindo a imensidão desse amor, a oração é o ficar perto dele, para que nos molde, nos transforme. Para que constranja no que tiver que constranger e inspire o que tiver que inspirar. Um amor que nos faça mais parecidos com ele mesmo a cada instante.

Feliz sábado, @migos!

Marco Aurélio Brasil - 18/11/05


Paulo Adriano Rocha
NINGUÉM PODE TE AMAR COMO JESUS TE AMA!
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